2006-09-28

O DIÁRIO DA MARGARIDA - OMEU PRIMEIRO ANO DE ESCOLA

Ontem, a Luísa aproveitou a tarde para uma nova arrumação no quarto das miúdas.
Faz duas semanas que lhes trocámos as camas e ela achou por bem reordenar a tralha de brincar. É que vem aí um novo móvel que servirá para escrivaninha e armário de apoio à actividade escolar, para já, da Margarida.

E como o espaço pareceu duplicar depois de todas as coisas postas no lugar devido.



Hoje, a Margarida goza a sua primeira folga.
Os trabalhos lectivos iniciar-se-ão na próxima segunda-feira.



A Professor chama-se Filomena Proença e, a seu respeito, também partilho a opinião do meu anjinho, pois igualmente me pareceu uma pessoa simpática. Exerce a docência há vinte e seis anos, embora apenas há meia dúzia esteja colocada nesta escola. Tanto quanto apurei junto da mãe de um ex-aluno dela, é exigente e cumpridora, além de saber o que faz e dela se poder dizer que ensina bem. A fonte desta opinião é igualmente uma docente que eu conheço a ponto de poder dizer que é uma boa profissional.
Tudo leva a crer que estamos em boas mãos.

Na recepção aos alunos e encarregados de educação, achou por bem falar do método de ensino que usará para levar os petizes a lerem. Apelidou-o como o método de leitura das vinte e oito palavras. Foi sucinta na exposição e precisa quanto àquilo que os adultos deverão saber respeitar.

Utilizando aquele número de vocábulos –designados como palavras estímulo- procurar-se-à que os alunos cheguem à escrita de cada um deles e a partir da visualização do respectivo grafismo e da figura correspondente que soletrarão.
Começam por aprender a ler e a escrever certas palavras e só no final do ano passarão ao som das letras e sílabas individualizadas.

Em conformidade, a Professora pediu aos pais para que não estranhassem que os filhos não falaassem da sonoridade das letras e sílabas e sublinhou a inconveniência de se encaminhar os instruendos por essa via.


Desconheço esta forma de ensinar e não me sinto minimamente habilitado a avaliá-la e muito menos a avançar por uma opção em eventual comparação com aquela que eu, em tempos, experienciei.
De qualquer modo, penso que será razoável confiar na sapiência e sensatez da Mestra e o mudar da cor do chão logo se encarregará de nos sussurrar se fizemos bem ou não.



A escola em pouco se parece com a que a minha memória guarda.
De semelhante tão só a estrutura do edifício e ainda assim por lá não faltam os retoques.

E as carteiras abancadas foram substituídas por pequenas mesas e cadeirinhas de fórmica laminada.



A todos os níveis a Margarida é uma criança saudável.
Somos pais abençoados por termos uma filha como ela é.
Tem seis anos e meio e pesa à volta dos vinte e cinco quilos e tem quase um metro e vinte de altura. É robusta e ágil e todos os parâmetros indiciam sanidade física. Teve varicela no princípio deste Verão e foi a única ocasião em que faltou ao jardim infantil por motivo de doença.
É uma criança calma e não ultrapassa os medos que são razoáveis para a sua idade.
Relaciona-se facilmente com os outros miúdos e não é invulgar que partilhe e respeite as brincadeiras dos colegas, apesar de geralmente evitar aquelas que lhe parecem mais disparatadas e inconvenientes, além de ter uma forte propensão para propor os motes e organizar as interpretações.
E tanto brinca só como na companhia de outrem, o que todos os dias faz com a irmã.
Fala com a fluência de um adulto e sabe construir frases e dar entoação às expressões.
Usa o raciocínio com destreza e faz com toda a facilidade certas induções e deduções, revelando grande intuição –quiçá, até mesmo, perspicácia- para formular as perguntas certas nas mais diversas situações.
Contudo é uma menina sensível e carinhosa. Tanto afaga os bonecos com todo o desvelo como se preocupa com o bem estar do semelhante.
Alegre e cantarolante, seus olhos brilham e é uma gracinha de ver como sabe ser cordial e educada no trato e regular nas saudações e graças.
Tem consciência do certo e do errado e não dá mostras de tirar partido da mentira.
Quês? É claro que também os há. Quem os não tem, não é verdade? Presta-se muito pouco a colaborar em tarefas que exijam um grande esforço físico e está sempre pronta a opinar sobre o comportamento alheio que ajuíza com o dogmatismo de uma verdadeira ortodoxia. Mas é justa nos julgamentos e, em defesa das suas razões, pede meças ao melhor dos sindicalistas.


Mas para mim é um pequeno deleite escutar as pequenas histórias que ela e a irmã criam nas brincadeiras quando se transmutam na pele de outras personagens.
Quando me rio, o que acontece repetidamente, mostro o quanto a alma se maravilha pelo carinho de poder usufruir este romance.



E em Sidney estão abertos os Jogos Olímpicos do ano dois mil.
Paz aos homens nestas alturas.

Enquanto almocei, tive o ensejo de assistir ao atear da chama olímpica.

E tive a sensação de estar perante o encantamento de uma banda desenhada, quando a reunião do fogo e da água surgiu do bico de um fogão que se elevou no céu com a pira circular que há-de permanecer acesa até que os jogos sejam, formalmente, encerrados.


O mundo é tão estranhamente maravilhoso.



E a desinformação continua.
Os jornais bem se esforçam por colocar a crise do PP no no centro das atenções políticas da opinião pública.
Quem ganhará com isso?



Ao jantar, a Luísa fez-me perceber um aspecto do método da leitura que a Professora da Margarida irá utilizar.
Os vinte e oito vocábulos são escolhidos de acordo com um determinado critério e a partir da palavra menina, que será tomada como base, formar-se-à um conjunto que acabará por abranger o alfabeto e as sílabas que em ele se encontram.



O dia dia foi duro mas acabou em repouso.
Gozando a frescura da esplanada da Júlia estivemos todo o serão na conversa.
As gatinhas brincaram, mas a Margarida lá teve que meter as suas colheradas nas conversetas dos crescidos e eu estiquei as pernas.


Pestanejando pelas agulhas de uma tamareira, a meloa de prata levou-me até ao céu.



Depois do banho as miúdas deitaram-se e o escritório mergulhou na emissão da TSF.



Vamo-nos deitar meu amor?

Alhos Vedros
00/09/15
Luís F. de A. Gomes