2006-11-07

O DIÁRIO DA MARGARIDA - O MEU PRIMEIRO ANO DE ESCOLA

Pobres daqueles que não sentem a alegria e o devaneio da partilha de momentos com as pequeninas coisas do quotidiano dos filhos.

É mais que evidente que, por vezes, o cansaço, as agruras das ondulações em que nos vemos forçados a viver, enfim, os picos mais ou menos longos e afiados que nos espetam o corpo enquanto seres culturais, é certo, diria que tudo isso acarreta impaciências e desejos de evasão e não é menos verdade que nem sempre somos capazes de evitar a derrota das desistências e das reacções indesejáveis. Muito prosaicamente, não pode deixar de ser considerada humana a vontade que alhures se acende de nos desligarmos dos nossos cuidados que, nessas ocasiões, inevitavelmente consideramos obrigações.

Contudo, se a nossa humilde humanidade nos dá um corpo para desfalecimentos, igualmente nos confere a habilidade da inteligência com que podemos reflectir e entender que os sinais de encantamento também se encontram à nossa volta e que a única coisa que se nos pede é apenas a disponibilidade para em eles atentarmos. E, amiúde, o espaço da nossa necessária individualidade resulta, tão só, da sabedoria de organizar o tempo de que possuímos o dom do domínio completo.

Pobres são aqueles que não se revivificam nos laços de um fim de tarde em torno da leitura de uma história ou até do mais elementar deleite em face de uma brincadeira dos petizes.


“-Oh pai, sabes o que é que nós fomos fazer ao parque novo, hoje? Adivinha lá. Fomos ver palhaços, fomos brincar ou fomos ver o batatoon?” –Perguntou-me a Matilde, depois de ter transmitido à irmã os cumprimentos que a sua ex-educadora lhe enviou.

Que mais felicidade pode um homem desejar do que ter dois doces corações como aqueles que eu tanto me esforço por merecer?



Hoje houve pintura e grafismos.

“-É um exercício que a Senhora Professora vos faz para treinarem a mão para fazerem o quê?”
“-Para escrever.” –Com aqueles olhinhos de uma dúvida resignada.

Mas também escreveram o número um e foram visitados por uma senhora -que a Margarida não foi capaz de explicar quem se trata- que lhes levou os livros de Religião e Moral Católicas que será ministrada no âmbito do horário curricular.

Bem, o livro custou trezentos e setenta escudos e já o paguei.

Alhos Vedros
00/10/10
Luís F. de A. Gomes