2006-09-29

O DIÁRIO DA MARGARIDA - O MEU PRIMEIRO ANO DE ESCOLA



Manhã de jardins e leitura.

As miúdas acompanharam a mãe na pedicura e o pai esteve de folga, até que as necessidades alimentares levaram a família às compras.

No intervalo tive oportunidade de comprar uma bicicleta de montanha que ofereci à Luísa.

O agradecimento foi um misto de beijos e sorrisos.



Acabei de ler “A Trilogia de Nova Yorque” de Paul Auster.
Não sei o que dizer sobre o escritor.

Este trabalho reúne três histórias que, no conjunto, me desiludiram.
Fica a sensação de verde. Dá a ideia que o Autor atenta demasiado nos pormenores do enredo e pouco na forma como o apresenta. Tem a favor o facto de escavar a alma humana mesmo que seja parco no aprofundamento o que, por enquanto, não tem mal nenhum. De qualquer forma e para já, a permanecer será por este último aspecto.
O pior, no entanto, é que as aventuras se repetem, pelo menos, nos dois livros que dele tive oportunidade de ler.
Deixando no ar o detrimento da criação relativamente à mais simples descrição de mundos, grande parte dos factos que compõem as ficções estão contidos na auto-biografia titulada “Hand to Mouth”.

Seja lá como for, tanto quanto me é dado saber, tem sido um sucesso de bilheteira.



Daqui a pouco, quando a Matilde acordar da sesta, iremos comprar os materiais escolares para a Margarida. O rol é longo.


Por ora a mãe e a filha mais velha repousam na sala.

Vou ler até que a mais novinha acorde.



Depois do lanche toda a família saiu.
Fomos comprar as coisas que constam da lista entregue pela Professora da Margarida.

O cômputo geral foram duas horas no hipermercado e três mil e tantos escudos de despesa, a juntar aos cinco mil que custaram os quatro livros recomendados.

Dos lápis de cor aos paus de plasticina, dos guaches e pincéis aos cadernos A5 e folhas de papel de lustro e papel manteiga, é farto o conjunto para que os venha aqui maçar com ele.
Apenas quero destacar a capa de micas que irá servir para que a Margarida reúna fichas decorrentes do seu processo de aprendizagem da escrita e da leitura, com as quais construirá “O Livro Dinâmico”, como lhe chamou a Professora, dado a obra crescer ao longo do ano lectivo, à medida que as páginas se forem consubstanciando como o repositório da sabedoria linguística da minha filha adorada.


Mas tudo isso nos cansou e como ainda perdemos mais uma hora para que a Margarida tivesse umas calças novas que lhe fazem falta, deve registar-se, acabámos por jantar chicken burguer’s.


Directos a casa, demos o banho regulamentar e ala para a cama que o sono já espreita.



Nestas últimas semanas as duas irmãs têm andado um tanto ou quanto alvoraçadas e mais quezilentas entre si e birrentas do que seria de esperar e, antes de mais, desejável.

Graças a Deus não é isso que as define.

Tenho para mim que a crise é compreensível e, naturalmente, será passageira.
Para além da excitação e do nervosismo que se gerou no espírito da mais velha por estar em vésperas de entrar na escola –e isto sem que nós tenhamos falado muito sobre o assunto e muito menos lhe tenhamos feito sentir qualquer pressão quanto à mudança que a nova situação, necessariamente, acarretará para a sua vida- teve também que enfrentar a supressão da sesta e, até esta última segunda-feira, a obrigação de um cedo erguer para que a pudéssemos deixar em casa dos meus pais, face às férias da Dona Rosaria, a nossa empregada e varinha de condão.
Assim não me parece que seja estranha a expressão de um certo cansaço de impertinência que lhe induzem acções descontroladas e irritações à flor da pele.
Acresce a adaptação às camas novas e já a pensar na adolescência e juventude, o que deixa à Matilde toda a liberdade de movimentos para chegar ao chão sem qualquer exercício de equilibrismo. Isto, por sua vez, contribuiu para que a mais nova se deixasse dormir mais tarde o que lhe reduziu as horas de sono. Vários foram os dias em que tive dificuldade em a acordar, pela manhã.
E o dia inteiro com a minha mãe deve confluir para o resto.Vontadinhas atendidas e transigências sempre foram más conselheiras para um comportamento sensato.


Infelizmente, a creche que a Matilde começará a frequentar esta ano ainda está em obras pelo que ali dará entrada só no próximo mês.

Então, com a Margarida já com duas semanas de rodagem, a rotina instalar-se-à e estou convicto que a normal tranquilidade voltará a instalar-se entre as gentes do nosso reino.



O que não está mesmo nada bem são as faltas de água que nos têm assolado no decurso deste Verão.
Hoje, o líquido deixou de correr quando eu começava a tirar o sabão dos cabelos e o banho matinal terminou com a Luísa a despejar o conteúdo de um garrafão sobre o meu corpo.

Como há quem insista em votar nestes autarcas que, desde a revolução de Abril, presidem ais destinos do nosso município é que me espanta.
Sem, embargo, aterroriza-me o que vejo nas oposições.
Por acaso serei capaz de ver algo mais que meras ambições pessoais?



Segundo um relatório das Nações Unidas, no mundo, há oitocentos milhões de pessoas com fome.



E eu, levitando, sob as copas bamboleantes e alaranjadas pela amêndoa que daqui a nada haverá de pratear a abóbada celeste.

Alhos Vedros
00/09/16
Luís F. de A. Gomes


CITAÇÕES BILBIOGRÁFICAS

Auster, Paul- HAND TO MOUTH
Faber and Faber, London/Bóston, 1998
- A TRILOGIA DE NOVA YORQUE
Tradução de Alberto Gomes
Asa (5ª. Edição), Porto, 1999