2007-06-30

O DIÁRIO DA MARGARIDA - O MEU PRIMEIRO ANO DE ESCOLA

As revoluções são mesmo assim. Começam por misturar os generosos, aqueles que estão empenhados na transformação das sociedades, com os oportunistas que sempre surgem para beneficiarem das novas distribuições de possibilidades. À medida que as situações ganham rotinas e se instalam os novos modos de vida, os primeiros costumam passar à história, umas vezes na qualidade de mártires, outras na de heróis, enquanto os outros ganham posição, fomentando então o aparecimento de uma terceira categoria que lhes protege o mando, os aparatchicks, precisamente aqueles que permanecem quando a lei da vida leva deste mundo todos aqueles que interpretam as horas revolucionárias.
Terá sido isso que se verificou ao nível do poder local, neste concelho da Moita, onde, desde as primeiras eleições livres, os comunistas sempre venceram com maioria absoluta.

Vem isto a propósito das comemorações de mais um aniversário do vinte e cinco de Abril que, em Alhos Vedros, tiveram o condão de se parecerem mais com as de uma efeméride sem importância nenhuma. Hoje, então, para além da morteirada que nos fez saltar na cama logo às oito da manhã e de torneios de chinquilho e malha ao longo desse período, restou uma tarde folga sem qualquer atractivo. E ontem à noite, por iniciativa da Junta de Freguesia, lá tivemos, no auditório da Velhinha, um daqueles cantores de bar, com um acompanhamento de música pré-gravado e a desfaçatez de entreter a mão cheia de público com anedotas de mau gosto, em que não faltaram as piadas aos alentejanos, aos gays e aos pretos. Curiosamente, os autarcas e os seus acólitos e familiares aplaudiram.

Enfim, é este o respeito que a liberdade lhes merece.


Uma vez que a Margarida tinha feito questão em assistir ao espectáculo, só tenho pena que as minhas queridas filhas tenham que crescer aturando atoardas destas.


Mas nem tudo se perdeu na noite de ontem.
Antes estivemos no atelier do Luís Guerreiro, para aí assistirmos à inauguração de uma exposição de banda desenhada em azulejo de sua autoria.
Embora pequeno, o espaço é agradável e a mostra dos trabalhos, a que se juntou um poema (1) da jovem Helena de Sousa Freitas e imagens da revolução em computador, estava ordenada com o bom gosto que faz bonitas as coisas simples.

É claro que todos agradecemos ao Luís um momento tão encantador que eu não tenho dúvidas em reputar como os nossos verdadeiros festejos da revolução dos cravos.



É importante comemorar Abril?
Claro que é, trata-se de uma data que marca o fim de uma tirania que é sempre a negação da nossa condição de humanos.
Por muito que os bem pensantes falem em contrário, as democracias são sempre os melhores dos mundos. Evidentemente que se desenvolvem em sociedades maculadas em que, tantas vezes, a miséria atira tanta gente para o limbo da humanidade. Mas são os únicos regimes que deixam em aberto as janelas por onde os homens podem fazer valer para si a dignidade que Deus nos deu.

Infelizmente, hoje em dia está graçando entre nós a falta de liberdade de informação que é um dos exercícios de controlo que podem manter de pé as instituições democráticas. Mas isso são contas de outro rosário.
Seja como for, foi a revolução de Abril que nos permitiu rumar à democracia e, nessa dimensão, trata-se de uma data sagrada que bem merecia o significado do nosso dia nacional.
Só o indivíduo abjecto que séculos de inquisição e, mais recentemente, o salazarismo nos deixaram bem fundo na alma, só isso nos impede de compreendermos aquela simbologia.



Ontem, o dia escolar foi dedicado a exercícios em torno da aprendizagem de uma nova palavra, desta feita galinha, a respeito da qual versou o trabalho para casa.
Na parte final da aula, a Professora falou aos alunos do significado do vinte e cinco de Abril e, a propósito, do que foi a noite fascista que nos agrilhoou o ser.



George Bush ameaçou a Republica Popular da China com a promessa que os Estados Unidos sairiam militarmente em defesa de Tawian.



A Margarida, ao fim da tarde, foi passear com o Zé e a Isabel, um casal amigo em casa de quem já jantou e com quem a Matilde viu o filme “Grinch”.

Ao fim da tarde eu fui buscá-la e a propósito de visitar a biblioteca do Zé e de aí ter reparado num tratado de Anthony Giddens, estive à conversa sobre racismo e as consequências perniciosas do relativismo cultural.



Por sua vez, a Matilde, esteve de passeio com o seu amigo André e a mãe dele.



E agora os anjinhos dormem.


Amanhã, eu e a mãe vamos a Évora.
Depois eu conto porquê.

__________
(1) Sousa Freitas, Helena de, pp. 51/52
O CRAVO
In “(DE)CORRENTE”

Alhos Vedros
01/04/25
Luís F. de A. Gomes


CITAÇÃO BILBIOGRÁFICA

Sousa Freitas, Helena de- (DE)CORRENTE
Prefácio de Ângelo Rodrigues
Editorial Minerva, Lisboa, 1999