2006-10-22

O DIÁRIO DA MARGARIDA - O MEU PRIMEIRO ANO DE ESCOLA

UM FIM-DE-SEMANA CULTURAL
Com toda aquela conversa, esqueci-me de referir o porquê de escrever sobre o que penso ser o homo maniatábilis.

O mote surgiu com uma notícia sobre o escândalo político e social que provocou a transmissão, nos telejornais dos principais canais públicos de televisão, em Itália, de imagens explícitas e chocantes sobre o desmantelamento de uma rede de pedofilia naquele país.
“Os responsáveis dos dois canais, Gad Lerner, director do telejornal da RAI Uno, e Ninno Rizzo nervo, director do Telejornal da RAI Tre, apresentaram nessa mesma noite um pedido de desculpas aos telespectadores, demitindo-se de seguida.”(1)


Parecido com o que se passa entre nós, não é verdade?

Pois foi esta pergunta que me levou a pensar no homo maniatábilis e assim surgiram as palavras que ontem escrevi.



Num destes dias o Tó passou pelo escritório para me oferecer a prova do seu primeiro trabalho literário. Era tal a azáfama que nem deu espaço para a menor indicação e o encontro foi de tal forma rápido que eu acabei por me esquecer de o referir neste diário.

“Há Sargos Para O Jantar” é o título do que se pode classificar como uma novela e que bem se agrupa neste género de histórias modernas. Já o tinha lido e, claro está, voltei a lê-lo.

Da primeira vez foi uma surpresa agradável.
A narrativa é interessante e, no fim, permite que nos interroguemos em várias direcções. Pode até ser tomada como uma parábola sobre a humanidade.
E tecnicamente está muito bem construída. Faz um bom uso de muitas maneiras de contar e as metáforas com que, aqui e ali, vai construindo o discurso, são pequenas flores que levam os campos a luzir de cores.
Para que nada falte, escava a alma humana naquilo que temos para nos salvarmos.


Diz que é a primeira vez que tenta algo no campo das letras.
Pois se assim é, e não tenho motivos para duvidar, só posso dizer que ali há dedo de escritor.


Este meu primo é uma pessoa curiosa.
Filho de um chefe de estação da CP, no Pinhal Novo, foi um daqueles jovens que, nos fins da década de cinquenta, cresceram paredes meias com o associativismo não engajado às autoridades oficiais e onde contactaram com um mundo de actividades adequadas a quem, no caso, completara o liceu.
Talvez por isso, em jovem, tenha sido dado à expressão artística e tenha feito teatro, semi-profissional, chegando a participar em uma ou outra representação televisiva.
Depois da guerra, em Angola, onde foi oficial ranger, abraçou uma carreira de executivo numa grande multi-nacional de produtos de higiene e beleza.
Aos cinquenta anos de idade quase faleceu com um ataque cardíaco que o levou à reforma.
Descobriu então a pintura e dedicou-se-lhe com tal afinco que hoje já possui uma obra volumosa.

E agora sentiu o apelo para dizer por escrito. Que o diga, pois di-lo muito bem.



Após o almoço que foi em casa dos meus pais –convidaram-nos para comermos tordos e fraca no forno- a Margarida resolveu os trabalhos de casa.


É que a manhã, depois das brincadeiras na cama dos pais, foi de ciclismo a que se seguiram fantasias no quintal da avó.
Ora assim é que deve ser.


Eu li o jornal, sentado num dos bancos frescos da praça e logo com a desgarrada de dois pintassilgos.



A Matilde dorme a sesta e a mãe e a Margarida saíram para assistirem a um recital na matriz da terra.

É o que se pode chamar um fim-de-semana cultural.



Ao fim da tarde tivemos a visita do Tomás que aqui ficou a brincar até à hora em que a São o veio buscar para o jantar.



Só tenho pena de não ter presenciado ao vivo o fogo de artifício do encerramento dos Jogos Olímpicos de Sidney.



E depois do silêncio, Putin veio publicamente incitar Milosevic a ceder a cadeira do poder e fala no reconhecimento da vitória de Kostunica.



Amanhã a Matilde entra no jardim-de-infância.

__________
(1) Quental, Ana Clara, p.52
PEDOFILIA EM HORÁRIO NOBRE

Alhos Vedros
00/10/01
Luís F. de A. Gomes
CITAÇÕES BIBLIOGRÁFICAS

Quental, Ana Clara- PEDOFILIA EM HORÁRIO NOBRE
In “Público”, nº. 3849 de 00/09/30

Tapadinhas, António Manuel- HÁ SARGOS PARA O JANTAR
Manuscrito Dactilografado
Impressão do Autor, Moita, 2000