2007-08-15

O DIÁRIO DA MARGARIDA - O MEU PRIMEIRO ANO DE ESCOLA

Ui que pandemónio que anda por aí em torno da programação televisiva que os indígenas consomem por cá.
Parece que a SIC, para fazer face às audiências que a TVI terá conseguido com o Big Brother e quejandos, lançou um programa qualquer em que expuseram o drama íntimo de uma família, provocado pela participação de uma jovem num reality show, o que terá merecido a crítica dos pais que se deslocaram da terra natal a Lisboa com o intuito de levarem a filha de regresso a casa. Aquilo que seria uma conversa privada foi transmitido, sem conhecimentos dos protagonistas, em directo, o que, em face do dramatismo da situação, levou a uma onda de protestos do público e dos nossos intelectuais e zelotas de serviço. Pediu-se a crucificação dos responsáveis e nos jornais circulou a hipótese, alegadamente a partir da Alta Autoridade para a Comunicação Social, de aquela estação televisiva ser suspensa.
E o Portugal Portugalzinho mostrou-se no seu melhor. É claro que ninguém falou de censura, embora muito se falasse nos limites e abusos da liberdade de expressão. E há pouco, no telejornal da RTP 2, a Alta Autoridade, pela pessoa do seu responsável máximo, veio resolver o caso através de… Coimas, pois então.
Devo dizer que raramente vejo televisão, até pela falta de tempo e oportunidade. Mas faria um esforço se sentisse que valia a pena.
Seja como for, o que sinceramente me espanta é toda esta onda moralista e intelectualóide de repulsa pela porcaria que passa pelo pequeno ecrã, vinda da parte de muito boa gente que nada disse das “Noites da Má Língua”, visto então como um programa divertido, das doses estupidificantes de telenovelas brasileiras, das histerias de gente aos berros e aos pulos em ditas produções de entretenimento ou dos reencontros de familiares e amigos desavindos ou separados há muito, com lágrimas e feridas à mostra, isto enquanto as conversas mais sérias ou os documentários educativos passaram para as calendas. Ainda hoje haverá uma entrevista com Stephen Jay Gould que será transmitida às duas da manhã.
Então essa gente não percebeu que o circo romano só pára quando houver sangue na arena?
É preciso muito descaramento para tanta hipocrisia mas enfim, nós sabemos que estamos na elevadíssima do país do padre Amaro.

Quanto a mim pouco me preocupam os Big Brothers e afins e até acho normal que existam coisas dessas e público para com elas se deleitar.
O que verdadeiramente me choca e honestamente me amedronta é que eu queira ver um telejornal e em vez de ficar a saber o que se passa no mundo que me rodeia, fique a saber dos dramas privados de famílias em conflito, quanto mais gratuito melhor e guerra, muita guerra que já nos é apresentada com a mesma naturalidade de um game boy. Com a agravante aterradora de não haver corrupção para ser denunciada, violações dos direitos para serem investigadas e outras maldades que mereceriam vir a público. A TVI já faz da sua própria programação e dos pobres diabos que promove os principais objectos dos seus blocos noticiosos.

Mas é claro, sobre o apontar o dedo e chamar os bois pelos nomes, já não ouvimos nenhuma das vozes que tão corajosas são nos protestos vazios.

É que todos os nossos intelectuais de meia tigela e moralistas de beco escuro têm empregos a manter e filhos a criar.
E a cloacazinha tapada pelas roupas.



Hoje houve álgebra. Os alunos deram os números treze e catorze, a respeito do que trouxeram trabalho para casa.



E agora cama.

Alhos Vedros
01/05/22
Luís F. de A. Gomes