2006-12-26

O DIÁRIO DA MARGARIDA - O MEU PRIMEIRO ANO DE ESCOLA

Nos Estados Unidos, a eleição presidencial manterá o suspense até à contagem dos últimos votos.
Ainda estão por apurar cinco mil e tantos boletins e os candidatos enviaram equipas de confiança para acompanharem aquela operação.
Para já, a única certeza é que haverá uma recontagem no estado da Florida, dada a diferença inferior a vinte mil preferências.
Ali se decidirá quem irá suceder a Bill Clinton como o próximo Presidente da única super-potência que resta na geo-política mundial.


Mas o mundo, por enquanto, também vive um impasse e é como se o escrutínio disso fosse um episódio reflexo.

Estamos na véspera de uma hecatombe qualquer.



E por cá a votação foi outra.

Com a abstenção do Engenheiro Campelo, o orçamento geral de estado foi aprovado por maioria.



Esta manhã os alunos experimentaram, pela primeira vez, a realização de dois ditados sobre as palavras conhecidas.
A Margarida teve apenas um erro no primeiro deles.
À tarde fizeram uma ficha do livro de Matemática.

E o trabalho de casa consistiu na grafia das vogais, em maiúsculas, um jogo para unir essas mesmas letras sob dois aspectos distintos, assim como a leitura e cópia da frase, “o menino e o memé” e o respectivo desenho. Por fim, a assinatura é já um problema rotineiro.



Enquanto esperei que os meus amores fizessem as suas sessões de ginástica, li um trabalho sobre a vida e a obra de Espinosa, Baruch Espinosa, filho de mãe portuguesa, o judeu dissidente que está na base da heterodoxia e o laicismo do pensamento moderno.

E como eu o sinto ainda tão perto de nós.

Do seu “Tratactus Thoelogico-Políticus”, finalizado em mil seiscentos e setenta, aqui transcrevo esta pérola:
“O derradeiro objectivo do governo não é governar ou reprimir pelo medo, nem exigir a obediência mas, pelo contrário, libertar todos os homens do medo, para que estes consigam viver na maior segurança possível, por outras palavras, reforçar o direito natural a existir e viver a sua vida sem se prejudicar a si e aos outros. O objectivo do governo não é o de transformar os homens de seres racionais em bestas ou marionetes, mas sim permitir que desenvolvam as mentes e corpos em segurança, e que utilizem a razão sem restrições, sem mostrarem ódio, raiva ou desespero, nem serem observados com olhos de inveja ou de injustiça. Com efeito, o verdadeiro objectivo do governo é a liberdade.” (1)

Foram estas as ideias tenebrosas a que a Santa Inquisição nos poupou.
Não tem nada a ver com o nosso atraso, pois não?



Na periferia de Luanda, ao fim de vinte e tantos anos e para comemorar o quarto de século da independência, a água canalizada voltará às torneiras de um bairro que outrora abrigou as famílias dos funcionários nativos da administração colonial.

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(1) Strathern, Paul, pp 59/60
BENTO ESPINOSA EM 90 MINUTOS

Alhos Vedros
00/11/08
Luís F. de A. Gomes


CITAÇÃO BIBLIOGRÁFICA

Strathern, Paul- BENTO ESPINOSA EM 90 MINUTOS
Tradução de Célia Laret Lopes
Editorial Inquérito, Mem Martins, 2000