2007-07-07



Um mercado ainda cheio de timidez.

O DIÁRIO DA MARGARIDA - O MEU PRIMEIRO ANO DE ESCOLA

VIVA O PRIMEIRO DE MAIO

“-Nem parece primeiro de Maio.” –Disse eu há pouco, ao sentar-me para beber a bica que se segue ao pequeno-almoço.
Com efeito assim é e já a mesma sensação me atravessou o espírito por ocasião do vinte e cinco de Abril.
É mais um feriado, retorquiram os presentes e ninguém poderia estar à espera que se comemorem estas datas com o mesmo entusiasmo com que tal aconteceu há vinte e tantos anos atrás.
Claro que não era nada disso que eu queria dizer, mas tão só que aquelas são especiais por serem repositórios das melhores tradições da luta contra a tirania, essa besta aviltante que sempre nos impede de sermos completamente humanos.
Certamente que a transmissão desse legado passa pela capacidade de comunicação inter-geracional dentro das famílias. É óbvio que é assim. Contudo, não são aqueles assuntos da esfera estritamente privada, pelo que não podem ou não devem ficar apenas a cargo daquelas células básicas da sociedade.
Do Estado então não se fala. Coisas destas não podem permanecer sob a responsabilidade dos estados, embora não esteja aqui a advogar a supressão dos mesmos o que seria manifestamente absurdo.
Acontece que aquelas são conquistas dos povos e são estes, através das suas organizações que lhes devem tecer as loas e atirar os foguetes. Por outras palavras, seria de esperar que a sociedade civil se manifestasse mais activa nestes domínios.
O problema é que não podemos partir do princípio que estas conquistas são dados adquiridos, pois se não nos prevenirmos, podem sempre ser reversíveis.
Pois era nisso que eu estava a pensar quando fiz o comentário inicial. Estava a manifestar o meu lamento por as colectividades, as associações –a sociedade civil do concelho- não aproveitem esta semana para chamar a atenção para a importância de vivermos livres.
Não, definitivamente, estes não são feriados como os outros, são datas com a particularidade de estarem associadas a essa condição fundamental para a dignidade humana.

E logo quando, entre nós, na preparação próxima do Congresso do PS que é, tão só, o partido do Governo, os socialistas do Porto dizem que não admitem –nem menos- críticas ao candidato àquele município ameaçando abandonarem a sala e os trabalhos se tal vier a acontecer.



A mãe e as filhas lá foram andar de bicicleta para o parque novo, aproveitando as delícias deste dia de folga.



E em algumas cidades europeias como Londres e Berlim, mas também na Austrália, em Sidney, por exemplo, o primeiro de Maio foi palco de manifestações contra a globalização.

Sinceramente pergunto-me se não há qualquer coisa de errado nestes protestos.
Com efeito, ataca-se as multinacionais acusando-as de explorarem os trabalhadores mas o resultado mais imediato é que se impede o mundo pobre de exportar os seus produtos, condenando-o assim a presa fácil dessas mesmas multinacionais que, por isso mesmo, engordando nos seus cabedais e poder, ficam dessa forma mais capazes de imporem os seus ditames aos parlamentos, inclusivamente dos países com sociedades e civilizações democráticas.


Em França, La Front National, de Jean Marie Le Pén, aproveitou para lançar a candidatura deste seu líder às presidenciais.



Por cá, neste reino desvairado, a inspecção-geral do trabalho divulgou a média de acidentes mortais, no universo laboral que foi, o ano passado, uma por dia.
Obviamente, é na construção civil o sector onde isso mais acontece.



Estamos tão perto das Filipinas, onde os acólitos do ex-presidente deposto por corrupção vieram a gerar violência nas ruas da capital.

Alhos Vedros
01/05/01
Luís F. de A. Gomes

2007-07-04


O cuidado do ornamento.

O DIÁRIO DA MARGARIDA - O MEU PRIMEIRO ANO DE ESCOLA

Como sempre, nas horas de aflição, lá se movimentam as vagas salvadoras e num momento em que o Governo e o partido que o suporta são ilhas que sofrem pressões de todos os lados, mais uma sondagem da Marktest vem dizer que, afinal, quem está a descer nas intenções de voto são os social-democratas em concomitância à subida do Partido Popular.
Na TSF, como não podia deixar de ser, logo apareceu o comentador Teixeira, sempre palavroso, pronto a dar credibilidade ao estudo e, claro está, não desperdiçando a oportunidade para dar razão a Luís Filipe Menezes que, por sua vez, neste fim-de-semana, voltou a disparar sobre o seu líder partidário.

Não tenhamos dúvidas, até ao Euro 2004, especialmente até que o novo estádio Pinto da Costa –será este o nome do futuro recinto desportivo do Futebol Clube do Porto, querem apostar?- esteja consumado, será esta a pronúncia do Norte.



Alheio a todas estas manifestações reptilíneas, Denis Titto, um milionário norte-americano de origem italiana, depois de pagar quatro milhões de contos à agência espacial russa por um lugar entre a tripulação, passou a ser o primeiro humano a fazer uma viagem turística ao espaço, especificamente, neste particular, ao interior da Estação espacial Internacional.

Não será propriamente dito o início de uma nova era, a do turismo cósmico. Por enquanto e durante muito tempo, só os muito ricos se poderão dar ao luxo de fazerem uma extravagância como esta. Mas é um marco cronológico e certamente que aquele engenheiro aeronáutico já tem o seu nome inscrito na história da astronáutica da humanidade.


Bem que eu gostaria de estar no seu lugar.


Os russos é que viram este desejo materializado em cheque como uma espécie de bênção para os seus depauperados recursos financeiros que o poder consegue disponibilizar para uma área em que, nos tempos soviéticos, já tiveram o primeiro lugar.



E enquanto no Peru o filho de Vargas Llosa retirou o apoio a Toledo, criando embaraços ao seu pai e ao próprio candidato, o País Basco prepara-se sob as pressões assassinas de um terrorismo fascista que se impõe ao povo pelo medo que a violência gera.


Não a propósito do caso Basco, mas o nacionalismo foi precisamente o mote de uma conversa que ontem à tarde tive oportunidade de travar com o Carlos Verdasca.
Ao contrário do que ele pretende, sou da opinião que não há nacionalismos bons nem maus; são sempre perniciosos. Trata-se daquele género de ideologias que uma vez postas em movimento não há forma de dizermos onde devem parar, isto é, somos sempre incapazes de identificar onde se poderão tornar mortíferas ou não. Alógica do nacionalismo transporta necessariamente o princípio da exclusão do outro e, nesse sentido, levado às últimas consequências, tem em potência a eliminação dos grupos sobre os quais, eventualmente, se possa abater.
Pode ser que seja uma utopia, mas ao nacionalismo oponho o universalismo o que não quer dizer que proponha a supressão dos estados, mas si e que me prece mais sensato que entre aqueles se desenvolvam meios de conveniência e aqui nem será impróprio considerar a velha noção de coexistência pacífica de Krutchov que pode muito bem ainda dar respostas positivas aos problemas dos tempos que correm.

Na verdade, para mim, são as pessoas que contam, embora compreenda quão longe estamos desse mundo.



Mas no que pessoalmente me diz respeito, este fim-de-semana, longo e relaxante, não se ficou apenas pela possibilidade de desfrutar a despreocupação da troca de ideias à mesa do café.
Além das manhãs de jornais e da hora na piscina, hoje tive direito à matiné de cinema e quase terminei uma leitura sobre o legado judaico.

O filme trata-se de “American Phsyco” uma película que tanto eu como a Luísa fomos unânimes em achar estranho, mas que me pareceu ser uma reflexão sobre a desumanidade a que o materialismo exacerbado pode conduzir. Com interpretações de primeira água e tecnicamente muito bem conseguido, merece-me oito pontos numa escala de zero a dez.

Por sua vez, o livro é uma obra de um académico norte-americano, Thomas Cahill, “A Herança Judaica” que, numa interpretação clara e inteligente dos textos bíblicos, por comparação com a literatura mitológica dos sumérios, procura apresentar-nos o que dos hebreus ficou para a humanidade que seria necessariamente diferente sem tal herança.
Num texto que fiz publicar no ano passado, já tinha referido o início do monoteísmo como uma revolução intelectual (1), mas aqui compreendemos que dele também derivaram a individualidade e, consequentemente, a liberdade (2), intuição que já se me formulara mas que nunca antes tinha conseguido enunciar de uma maneira tão precisa.



Na sexta-feira, os alunos fizeram exercícios com a nova palavra durante a manhã e à tarde trabalharam a página do livro de Matemática relativa ao número dez.

Segunda-feira há folga, mas a Professora não se esqueceu dos trabalhos para casa.



Compreendo perfeitamente a Aliança entre Israel e a Turquia mas não sou capaz de entender que daí derive aquilo que parece ser uma desculpabilização dos morticínios em massa sobre as populações arménias do Império Otomano, no início do século vinte. Um silêncio sobre tais crimes, ainda seria um elefante a engolir, mas as palavras de Shimon Peres, negando que então tenha acontecido um genocídio é que não podem ser aceitáveis na boca de um judeu.

Mas a geo-política nada tem a ver com a moral, pois não?



A Margarida ontem teve a visita de uma colega que depois de uma tarde de brincadeira em nossa casa, acabou por lanchar connosco.

E hoje foi de passeio de catequese a Évora e a Vila Viçosa.
Escusado será dizer que a viagem correu bem e que a miúda regressou cansadinha mas encantada. Viram a Capela dos Ossos e o Palácio dos Duques de Bragança e passeara, pelos jardins, fazendo o almoço na forma de um piquenique.


A Matilde, essa, gozou a exclusividade dos pais e depois de uma manhã de triciclo e com os joguinhos da “Terra do Nunca”, desfrutou dos baloiços e de um lanche no café da Júlia.


Agora dormem, felizes e quietinhas, enquanto lá fora a noite está fria.

__________
(1) Gomes, Luís F. de A.
DOIS MARCOS PARA A NOÇÃO DE HUMANIDADE
(2) Cahill, Thomas, pp. 89 e ss
ob. cit.

Alhos Vedros
01/04/29
Luís F. de A. Gomes


CITAÇÕES BIBLIOGRÁFICAS

Cahill, Thomas- A HERANÇA JUDAICA
Tradução de Mário Dias Correia
Contexto Editora (1ª. Edição), Lisboa, 2000
Gomes, Luís F. de A.- DOIS MARCOS PARA A HISTÓRIA DA HUMANIDADE
In “O Largo da Graça”, nº. 6
Internet, 2000

2007-07-02



Pormenor de uma cidade que se pretende virar para o bem estar dos seus habitantes e cativar o forasteiro que ali se queira perder.

O DIÁRIO DA MARGARIDA - O MEU PRIMEIRO ANO DE ESCOLA

O MAIA MERECIA MAIS

Ontem, em Paris, a selecção portuguesa perdeu com a congénere francesa pela marca de quatro a zero.
O seleccionador nacional queixou-se da organização do nosso futebol.


É mais um exemplo da índole de muitos dos responsáveis que temos à frente dos nossos destinos colectivos.



E hoje de manhã, eu e a Luísa vimo-nos na obrigação de nos deslocarmos a Évora, ao Governo Civil, para renovarmos os passaportes que estarão prontos na tarde da próxima quarta-feira.
Na passada terça-feira, por volta das três da tarde, fiquei a saber que para entrarmos na Turquia precisamos que aquele documento tenha uma validade nunca inferior a seis meses o que nos deixou numa situação embaraçosa, uma vez que aqueles que possuímos caducariam a vinte e três de Julho.
A coisa não mereceria reparo se não fosse o caso da impossibilidade de satisfazermos as nossas necessidades em tempo útil. Em Lisboa só conseguiríamos aquilo que queríamos em vinte e cinco dias e em Setúbal nunca antes do dia oito. Ora como temos voo marcado para segunda-feira, sete de Maio… Lá fomos directos àquela que é cidade património da humanidade, lamentavelmente sem tempo para nos perdermos na sua história.

Mas o que me espanta é o país em que estamos.
Se um empresário precisar de sair do país com urgência, por motivos de negócios e precisar de um passaporte de um dia para o outro, arrisca ver o seu labor por água a baixo.

E depois digam lá que não estamos num país desenvolvido que flui ao ritmo da economia coeva?


Bem, pois fiquem por ora descansadinhos. Ficámos a saber que em Beja seria possível obter a papelada no próprio dia.

Estão a ver como é prático viver em Portugal?



Hoje os alunos fizeram exercícios de leitura e à tarde trabalharam uma ficha de Matemática em que aprenderam o número dez.



Mas voltemos ainda ao dia de ontem para falar do file de Inês Medeiros sobre o vinte e cinco de Abril que eu não tive oportunidade de ver no grande écran e, por isso mesmo, fiz questão em não perder a passagem na RTP1.
Para grande pena minha, trata-se afinal de um trabalho limpinho, bem arrumadinho, com as imagens da multidão bem feitinhas e montadinhas, os actores bem conduzidos e com bons desempenhos, mas, lá no fundo, tal como em muitas outras conversetas, não passando de uma boa oportunidade para estarmos calados. Quer dizer, provavelmente o único resultado será impedir uma abordagem mais séria e artisticamente mais elaborada que o tema, per si, naturalmente reclamaria. E isto dando, desde logo, de barato, aquela falha técnica em que, ao contrário dos relâmpagos, escutávamos o som das palavras antes de vermos de vermos os lábios que as pronunciavam com o movimento respectivo.
Sobretudo foi a estrutura narrativa que não convenceu, perdendo-se o efeito de suspense quanto à incerteza do desenlace que os que viveram a história, por certo, sentiram. Até a libertação dos presos políticos no próprio dia do golpe –que, na realidade, só veio a acontecer na noite do dia seguinte- muito poderia ter contribuído para aquele efeito e até para um final apoteótico que pontuaria, a preceito, o lado épico de um tal evento e que, do modo como nos foi apresentado na película, com o Capitão Maia a dizer ao amigo, depois do trabalho feito, que queria ir até Caxias para o ver, mais se pareceu com os últimos momentos de uma romaria a que os organizadores não quiseram deixar de assistir, como forma de usufruírem de alguns instantes de gozo a que a azáfama da realização os havia furtado.
Com a agravante suplementar que a grandeza heróica daquele homem mereceria mais, muito mais do que a homenagenzinha que ali se lhe quis prestar.

E todas aquelas cenas pueris de querer marcar o contra-ponto com os velhos tempos através de uma queca entre um maçarico e a namorada dentro de um chaimite que aparentemente seria necessário ao combate mas que em acto contínuo já não era, tudo acabando com uma espécie de deserção e o grito da namorada de “-Viva a liberdade!” Assim com a figura interpretada pelo Joaquim de Almeida, símbolo da esquerda retórica e inoperante que esconde a cobardia atrás de um pretenso pessimismo…
Ai, tudo isto tem um sabor tão, tão, adolescente.

Ou o recurso a figuras conhecidas do nosso mundinho cultural, como nos casos do vocalista dos Ena Pá 2000, do José Jorge Letria e até do papá Vitorino…

Tudo isso acaba por redundar numa longa-metragem tão politicamente correcta quanto fraca.


E para cúmulo não sei se não se encontrará ali uma pitadinha de inveja quando um filme que, tudo o indica, pretende ser rigoroso na reconstituição histórica, esquece a figura de Francisco Sousa Tavares que, entre os civis, também foi um dos protagonistas daquele que foi o acontecimento mais marcante da segunda metade do século vinte português.


Ainda bem que não perdi tempo a ver isto no cinema.



E hoje fui vítima de mais um desfile oportunista das vaidades que pretendem brilhar à custa do alheio.
Foi o caso do livro que compila uma entrevista com um Agostinho da Silva terminal e que regista uma conversa com parco interesse pelo que nada acrescenta ao pensamento do homem. (1)

Enfim… Mas reparei que os direitos de Autor não deixaram de correr a favor do entrevistador.



Pois bem, agora vou-me deitar que este foi um dia longo e eu estou exausto.

__________
(1) Silva, Agostinho da
A ÚLTIMA CONVERSA DE AGOSTINHO

Alhos Vedros
01/04/26
Luís F. de A. Gomes


CITAÇÃO BIBLIOGRÁFICA

Silva, Agostinho da- A ÚLTIMA CONVERSA
Entrevista de Luís Machado
Prefácio de Eduardo Lourenço
Editorial Notícias (8ª. Edição), Lisboa, 2001

Museu Judaico, pequena unidade que nos dá conta da vida de uma comunidade secular.

O DIÁRIO DA MARGARIDA - O MEU PRIMEIRO ANO DE ESCOLA

Mais triste que a ignorância é a presunção de sabedoria.